Modelos de Comunicação

A comunicação, enquanto processo, é indissociável do universo em que ocorre. Qualquer acto comunicativo está ligado ao todo, tudo está ligado com tudo. No entanto, para tornar a realidade compreensível, ou seja, para tornar compreensíveis os actos comunicativos, os teóricos têm desenvolvido vários modelos dos processos comunicacionais. Estes foram criados e têm como objectivo compreender e estudar a realidade comunicacional. São vários os modelos de comunicação existentes, no entanto neste trabalho irão ser abordados quatro desses modelos, são eles os modelos de base linear ou de informação, os modelos de base cibernética ou circulares, modelos de comunicação de massas, e os modelos culturais ou socioculturais.

 

1-Modelos de Base Linear

Os modelos de base linear, são modelos que dissociam as funções do emissor e do receptor e apresentam a comunicação como sendo a transmissão de mensagens entre esses dois pontos e num único sentido1. Neste campo surgiram vários modelos de comunicação, sendo os mais representativos o modelo linear de Lasswell, Shannon, Weaver e Schramm, sendo que neste trabalho os que irão ser estudados são os modelos lineares de Lasswell e o de Shannon e Weaver.

 

1.1) Modelo Linear de Lasswell

Lasswell sustentou que uma forma de descrever um acto de comunicação é responder a cinco questões: Quem?; Diz o Quê?; Através de que meio?; A quem?; Com que efeito?

Este modelo indica-nos que a iniciativa de um acto de comunicação é sempre do emissor e que os efeitos ocorrem unicamente no receptor, quando, na verdade, um acto comunicativo não tem início bem definido e os emissores e receptores se influenciam mutuamente2. De acordo com Lasswell, o estudo da comunicação tende a centrar-se nas interrogações que fazem parte do seu modelo. Pode, assim, sistematizar-se o estudo da comunicação em vários campos:

Quem?

Estudos sobre o emissor e a emissão das mensagens

Diz o quê?

Análise do discurso

Por que canal?

Análise do meio

A quem?

Análise da audiência e estudos sobre o receptor e a recepção de mensagens

Com que efeito?

Análise dos efeitos das mensagens e da comunicação

Este modelo é baseado em três premissas fundamentais, são eles:

· Os processos de comunicação são estritamente assimétricos, com um emissor activo que produz o estímulo e uma massa passiva de destinatários que, ao ser “atingida” pelo estímulo reage.

· O processo comunicativo é intencional e tem por objectivo obter um determinado efeito, observável e susceptível de ser avaliado.

· Nos processos comunicativos, os papéis de comunicador e destinatário surgem isolados, independentes das relações sociais, situacionais e culturais em que estes se realizem1.

Este esquema linear apresentado por Lasswell é caracterizado pela apresentação de um sujeito estimulador (quem?) que gera estímulos provocando um conjunto de respostas no sujeito experimental (receptor); por estímulos comunicativos (o quê?) que originam uma determinada conduta comunicativa; por instrumentos comunicativos, linguagens e suportes, métodos e técnicas que tornam possível a aplicação dos estímulos comunicativos (em que canal?); e por um sujeito experimental (a quem?) que recebe esses estímulos e vai reagir de acordo com eles (efeitos) 2.

1.1.1 - Críticas ao Modelo

O modelo de Lasswell é um modelo claramente funcionalista, pois atomiza e articula em vários segmentos funcionais, objectivados, o fenómeno da comunicação, propondo, consequentemente, vários campos de estudo. Assim, o modelo mereceu várias críticas, sobretudo dos teóricos que não se revêem nas posições funcionalistas. Estes dizem, por exemplo, que o modelo de Lasswell é linear, quando o processo de comunicação é complexo, admitindo várias formas que transvazam dessa aparente linearidade; que é um modelo redutor, já que não dá conta de várias variáveis, como o feedback; que é um modelo compartimentado, pois segmenta em diferentes elementos aquilo que, na realidade, é um todo, o processo de comunicação; que é um modelo que pressupõe que o efeito constitui uma mudança observável ou mesmo mensurável que se regista no receptor, quando isto pode não ocorrer; finalmente, que não dá conta do contexto do processo de comunicação, nomeadamente da história e circunstâncias dos seus elementos. Este modelo teve o inconveniente de ter suscitado várias abordagens importantes e decisivas, mas que não tinham ligação entre si e impediam a construção de uma síntese coerente do modelo, no seu todo, levando a que o fenómeno da comunicação fosse abordado de ângulos diferentes, tais como a produção, o conteúdo, os media, a audiência e o impacto.

No entanto e independentemente das críticas, o modelo de Lasswell é bastante pertinente, constituindo, ainda hoje um bom auxiliar para o estudo da comunicação. Aliás, o modelo de Lasswell foi proposto num tempo em que os estudos da comunicação ainda se estavam a desenvolver, representando um passo em frente para o conhecimento comunicacional2.

1.2) Modelo Linear de Shannon e Weaver

Um outro processo de comunicação foi apresentado, em 1949, pelo matemático Claude Shannon e pelo engenheiro Warren Weaver. Tratava-se de um modelo para o estudo da comunicação electrónica. No entanto, o modelo pode ser aplicado ao estudo de outras formas de comunicação. Para Shannon e Weaver, o processo de comunicação electrónica pode ser descrito graficamente da seguinte maneira:

clip_image002[6]

Segundo o esquema, a fonte de informação elabora e envia uma mensagem; a mensagem chega a um transmissor, que transforma a mensagem num sinal. O sinal pode estar sujeito a ruído (interferências). Por esta razão, o sinal emitido pode ser diferente do sinal captado pelo receptor. O receptor capta o sinal e fá-lo retornar à forma inicial da mensagem, de maneira a que esta possa ser percepcionada e compreendida pelo receptor.

Num exemplo prático, um jornalista de rádio pode enviar uma mensagem oral aos destinatários por meios analógicos. Essa mensagem será transformada pelo microfone e pelo transmissor de rádio numa onda electromagnética análoga à onda sonora, o sinal. O sinal pode estar sujeito a interferências, ou seja, a ruído. Um receptor de rádio, como os pequenos rádios domésticos a pilhas, capta esse sinal e converte-o, de novo, em ondas sonoras. Ou seja, converte a mensagem na sua forma original (se não existir ruído). A mensagem é captada pelo destinatário2.

De acordo com o seu modelo, os autores identificaram três ordens de problemas no estudo da comunicação:

a) Problemas técnicos, ligados à precisão da transmissão dos sinais;

b) Problemas semânticos, ligados à precisão do significado pretendido para uma mensagem;

c) Problemas de eficácia, ligados à forma como o significado recebido influencia o comportamento do destinatário.

1.2.1 - Críticas ao modelo

O modelo de Shannon e Weaver pode ser criticado pela sua linearidade, incompletude e estatismo (não tiveram em consideração a interacção com o receptor, o papel das redes de comunicação, não reconhece fenómenos como o feedback, negligenciaram a componente semântica das mensagens)1. No entanto, representou um avanço na figuração paradigmática do processo de comunicação. Além disso, não deve ser ignorado que os seus autores procuravam traduzir exclusivamente o processo de comunicação electrónico mediado (como acontece quando se usa o telefone, um telégrafo, etc.)2.

2- Modelos de Base Cibernética

Os modelos cibernéticos são todos aqueles que integram a retroacção ou feedback como elemento regulador da circularidade da informação.

O primeiro autor a utilizar a palavra «cibernética» foi Platão, referindo-se à «arte de pilotagem», bem como, no sentido figurado, à arte de dirigir os homens. Numa concepção moderna, enquanto ciência, foi Norbert Wiener que a considerou como a «teoria da regulação da comunicação», ou seja, a cibernética é a «arte de assegurar a eficácia da acção», onde a retroacção, ganha papel principal. O conceito de retroacção ou feedback pretende referir o «fenómeno de retorno do efeito de divulgação de uma mensagem», ou seja, a resposta de uma audiência a um produto mediático (os estudos de mercado, os inquéritos de opinião…).

Na comunicação entre duas ou mais pessoas é o feedback que permite que a resposta se ajuste à pergunta do outro, não só nos aspectos linguísticos, mas também nos paralinguísticos. Em suma, na teoria da comunicação o feedback é o mecanismo que garante a eficácia da acção.

Em seguida vou apresentar alguns modelos cibernéticos, que apresentam em comum o facto de incluírem no seu processamento da informação o elemento da retroacção.

2.1) Modelos de Comunicação Interpessoal

Os modelos de comunicação interpessoal, traduzem uma comunicação numa situação de interacção face-a-face, consistindo em eventos de comunicação oral e directa.

2.1.1 - Modelo de Comunicação Interpessoal de Schramm

O modelo de comunicação interpessoal de Schramm ( foi o segundo modelo apresentado por Schramm sendo que o primeiro foi um modelo linear) pode ser graficamente traduzido da seguinte maneira:

clip_image002

Schramm acrescenta aos modelos lineares uma nova dimensão, na medida em que através da retroacção vai haver um intercâmbio e inter-influência que cada um exerce sobre o outro. De acordo com Schramm o acto comunicativo é interminável, afirma que é erróneo evidenciar que o processo de comunicação tem um início e um fim determinado.

Em síntese, o modelo de Schramm propõe que cada emissor pode também funcionar como receptor num mesmo acto comunicativo (devido ao mecanismo de retroacção ou feedback). Cada emissor/receptor tem a habilidade de descodificar e interpretar mensagens recebidas e de codificar mensagens a emitir. Embora o modelo não o traduza, Schramm salientou que quando se emite uma mensagem, na realidade emitem-se várias mensagens. Por exemplo, na comunicação interpessoal ou televisiva, não conta apenas o que se diz, mas também como se diz, a postura, o vestuário, o penteado, etc. Uma notícia num jornal é apresentada de uma determinada maneira, sujeita a princípios de organização e hierarquização que decorrem do design de imprensa2.

2.1.2 - Modelo Circular de Jean Cloutier

Jean Cloutier é o autor mais representativo desta corrente comunicativa, este teórico defende que o esquema de Emerec não é estático, mas sim que está em movimento e varia continuamente segundo os tipos de comunicação estabelecida. Não é linear, «mas concêntrico, visto que o seu ponto de partida é sempre o ponto de chegada» e sobretudo, o feedback não é um elemento acrescentado e supérfluo, mas inerente ao ciclo da informação.

O esquema da Era de Emerec assenta no seguinte: em primeiro lugar, Jean Cloutier afirma que todos os esquemas são orientados a partir de cada Emerec, ou seja, a partir de cada indivíduo que recebe ou emite informação. Informação essa que só consegue ser concretizada se a linguagem e a mensagem estiverem indissociáveis, pois é a linguagem que permite encarnar uma mensagem. Defende também que é fulcral a existência do médium, ou meio, visto que só através deste é possível transportar as mensagens no tempo e no espaço1.

2.2) Modelos da Comunicação de Massas

Este modelo de comunicação foi inserido nos modelos de base cibernética devido ao facto dos meios de comunicação de massa se basearem na retroacção como elemento regulador da sua boa aceitação por parte do seu público.

2.2.1 – Modelo Geral de Comunicação (Gerbner)

Gerbner é o teórico de um modelo apresentado em 1956, este modelo caracteriza-se pelo facto de poder apresentar diferentes formas em função do tipo de situação de comunicação que descreve. Os seus elementos podem ser utilizados como blocos de construção, possibilitando descrever processos de comunicação simples ou complexos, como uma produção (de mensagens) e uma percepção (de mensagens e acontecimentos a comunicar). O modelo permite abordar questões sobre a natureza e a inter-relação entre percepção e produção.

O modelo de Gerbner pode ser utilizado para diversos fins, por exemplo, descrever a comunicação mista entre humanos e máquinas.

É também utilizado para diferenciar áreas de investigação e construção teórica. Tal como Lasswell com a sua fórmula, Gerbner usou o seu modelo para ilustrar e explicar os principais procedimentos de análise de conteúdo.

O carácter flexível deste modelo confere-lhe utilidade em diferentes níveis. Ao nível indivíduo-indivíduo pode, por exemplo, ilustrar problemas comunicacionais e de percepção na psicologia aplicada aos testemunhos em tribunal: até que ponto é adequada a percepção da testemunha M em relação ao acontecimento A, e até que ponto A é bem expresso em DA, e em que grau é que a percepção DA do juiz M corresponde a DA? Ao nível societal, imaginemos que A é uma notícia ou mesmo a realidade, M representa os mass media, DA o conteúdo mediático e M a audiência. Temos assim um modelo que possibilita fazer perguntas como “qual a correspondência entre a realidade e a notícia (A e DA) tal como é dada pelos media? (M) e a que ponto o conteúdo dos media é bem compreendido pela sua audiência (M)? – Modelo aplicado à comunicação de massas3.

2.2.2 – Modelo da Comunicação de Massas de Schramm

No modelo deste teórico (ver figura) as mensagens são inúmeras mas idênticas, o emissor é colectivo, são ao mesmo tempo, o  Modelo de Schrammorganismo e os mediadores que dele fazem parte. As operações de codificação, interpretação e descodificação existem e são obra de vários especialistas que utilizam fontes exteriores (por exemplo num jornal serão os despachos das agências, as informações recolhidas pelos jornalistas) e têm em conta a retroacção ou o feedback induzido (dando o mesmo exemplo do jornal, tal será observado pelas cartas dos leitores ou pelo número de tiragem).

As mensagens emitidas são múltiplas, mas idênticas – é a mensagem original que é ampliada e dirigida para uma multidão de receptores que, cada um por si, a vai descodificar, interpretar e, por sua vez, codificar. Cada receptor faz parte de um grupo e as mensagens difundidas pelos mass media vão prosseguir o seu caminho através desses grupos1.

2.2.3– Modelo do Processo de Comunicação de Massas (Maletzke)

Através deste modelo, Maletzke evidencia a extensão do processo de comunicação de massas com base nas suas implicações sócio-psicológicas.

Maletzke no seu esquema apresenta alguns elementos já abordados anteriormente, Comunicador, Mensagem, Meio e Receptor, adicionando mais dois elementos que surgem entre o meio e o receptor. Um deles é a pressão ou constrangimento causado pelo meio, este teórico defende que o dia-a-dia do receptor é completamente influenciado pelas características, princípios e conteúdos do meio. O outro é a imagem que o receptor tem desse mesmo meio, o qual influencia a sua escolha relativamente aos conteúdos.

2.3) Modelos Culturais ou Socioculturais

Esta corrente encontra-se mais preocupada com a cultura de massas e as suas repercussões na sociedade, do que com os próprios meios de comunicação de massas. É por isso uma concepção mais sociocultural.

São representativos desta corrente o investigador francês Edgar Morin, passando por Pierre Schaeffer e Abraham Moles.

A característica fundamental é o estudo da cultura de massa distinguindo os seus elementos antropológicos mais relevantes e a relação entre o consumidor e o objecto de consumo.

2.3.1 - Modelo Cultural de Edgar Morin

Edgar Morin desenvolve a tese segundo a qual a cultura de massas é o produto de um processo dialéctico entre criação, produção e consumo. O sucesso junto do grande público depende do grau de eficácia da resposta às aspirações e necessidades individuais.

É pois uma espécie de relação de três elementos. À individualização da criação original, ele opõe a estandardização da produção conformista que permite a democratização do consumo cultural universal. O investigador, centrando a análise, por um lado, na cultura de massas, que denomina de indústria cultural e, por outro, no fenómeno do consumo cultural, desenvolve a tese segundo a qual a cultura de massas é o produto de um processo dialéctico entre criação, produção e consumo1.

2.3.2 - Modelo Cultural de Abraham Moles

O modelo deste investigador insere-se numa perspectiva cibernética, ele defende que estamos perante uma sociodinâmica da cultura, na medida em que há uma interacção constante entre a cultura e o meio a que ela pertence, interacção essa realizada pelos criadores que provocam a evolução.

Segundo Abraham Moles a comunicação está envolvida em quatro elementos, o macro-meio representa a sociedade em si, integrado nela está o criador, este é aquele que age, tem como objectivo desenvolver ideias novas, desempenhando assim actividade em todos os ramos em função de um micro-meio, sendo este entendido como um subconjunto da sociedade, através dos mass-media .

1Freixo, Manuel João Vaz. Teorias e Modelos de Comunicação. Lisboa: Instituto Piaget, 2006

2Sousa, Jorge Pedro. Elementos de Teoria e Pesquisa da Comunicação e dos Media. Porto, 2006

3Blog do Curso de Comunicação Aplicada. Universidade Lusófona

Comunicar tornou-se, em todas os domínios da nossa actividade, um verdadeiro imperativo categórico. Todos os nossos comportamentos são transformados em comunicação, os nossos gestos são descodificados, até os mais íntimos conseguem ser transformados deixando passar uma mensagem.

Nos dias de hoje a comunicação assume uma enorme importância, sendo mesmo considerada a solução de grande parte dos problemas das sociedades actuais.


Utopia da Comunicação

Durante séculos, o homem ocidental pensou a ciência e a técnica – no âmbito daquilo a que Heidegger chamou uma concepção “instrumental e antropológica”, e que se pode resumir em duas proposições fundamentais: a primeira, a de que a técnica é um conjunto de instrumentos ou meios criados pelo homem, resultantes da aplicação da ciência; a segunda, a de que a técnica está ao serviço do homem que a cria, orientando-se por finalidades por ele determinadas. Ora, os acontecimentos traumáticos da 2ª Guerra Mundial – o holocausto, a bomba atómica, a guerra de extermínio – tornaram visível a todos, do cientista ao homem comum, a impossibilidade de manter uma tal concepção da ciência e da técnica.


Este “desmentido”, ao incidir sobre a ciência e a técnica e, no fundo, sobre aquilo a que se costuma chamar a “razão”, parece colocar radicalmente em causa a possibilidade de toda e qualquer utopia futura – na medida em que toda a utopia se pretende, precisamente, como um projecto de organização mais “racional”, simultaneamente mais sábia e mais justa, da sociedade.


É neste contexto histórico-ideológico do pós 2ª Guerra Mundial, e para responder mais uma vez ao dilema entre a impossibilidade da utopia e a sua absoluta necessidade, que começa a surgir, nos Estados Unidos da América, aquilo a que alguns autores têm vindo a chamar a “utopia da comunicação”.


O projecto utópico que se articula em torno da comunicação é ambicioso. Este desenvolve-se em três níveis, são eles uma sociedade ideal, uma outra definição antropológica do homem e uma promoção da comunicação como valor. Esses três níveis concentram-se em torno do tema do homem novo - Homo communicans.


Um homem novo

Segundo Wiener, esse homem novo é um ser sem interior e sem corpo, que vive em uma sociedade sem segredo; um ser totalmente voltado para o social, que só existe através da troca e da informação, em uma sociedade tornada transparente graças às novas "máquinas de comunicação".

A concepção deste “homem novo” articula-se em redor de dois princípios, o de que todo o ser que comunica a um certo nível de complexidade é digno de ver reconhecida a existência enquanto ser social, e que não é o corpo biológico que sustenta essa existência, mas antes a natureza “informacional” do ser considerado.

Esta nova centragem do ser humano, por parte de Norbert Wiener, permite caracterizar o homem, não como sujeito individual, mas antes a partir da sua actividade de permuta social.


É precisamente neste campo que os media emergem como instrumento essencial e decisivo e que permite ao homem reagir, de forma adequada, às circunstâncias que o envolvem e solicitam.


Uma Sociedade de Comunicação

Esta utopia, que tem em Norbert Wiener um dos seus principais promotores, vê no desenvolvimento da comunicação – que entende como troca ou circulação de informação – e dos meios de comunicação - que designa por imprensa – a possibilidade de construir uma sociedade verdadeiramente democrática, alternativa quer ao comunismo quer ao nazi-fascismo. Essa sociedade assentaria em três princípios fundamentais:

i) O consenso, no sentido de tomar todas as decisões da forma mais racional, fria e desapaixonada possível, permitindo que, face a um determinado problema, todos os cidadãos tenham a mesma liberdade e oportunidade de apresentar as suas soluções, defendê-las com os seus argumentos e, mediante uma discussão aberta e igualitária, chegar a uma solução aceite por todos, evitando assim os conflitos sociais auto-destrutivos.

ii) A transparência, como modo de trazer ao conhecimento dos cidadãos todos os assuntos de interesse público, de tornar claras todas as decisões políticas, de eliminar todos os “segredos de estado”.

iii) A auto-regulação, no sentido de que, como qualquer organismo ou máquina inteligente, a sociedade terá os seus próprios mecanismos homeostáticos, susceptíveis de detectar atempadamente os problemas e desequilíbrios que poderão, assim, ser resolvidos de forma mais rápida e eficaz possível – para o que Wiener confia, e muito, nas “máquinas inteligentes” que começam então a desenvolver-se; poderá mesmo colocar-se a hipótese de, num futuro não muito distante, o Estado deixar de ser necessário, passando todo o poder para os cidadãos ou, pelo menos, para órgãos cada vez mais descentralizados e participados.

O problema da “utopia da comunicação” é, no fundo, o de todas as utopias: o de que elas prometem ser sempre mais do que aquilo que, de facto, podem dar.

Sublinhe-se, desde já, que a “utopia da comunicação” não é apenas mais uma das utopias em que a modernidade tem vindo a ser fértil. Enquanto que as restantes utopias se caracterizam por uma dialéctica união-conflito que não pode deixar de excluir ao mesmo tempo que inclui, a utopia da comunicação apresenta-se, hoje, como uma utopia da união de todos com todos, da inclusão total. Ela só não incluiria os que se recusassem a comunicar; o que, afirmam os seus promotores - que nesta matéria subscreveriam plenamente a afirmação dos pensadores da “Nova Comunicação” e da Escola de Palo Alto “não podemos não comunicar” -, se revela completamente impossível, na medida em que a própria recusa da comunicação já é, e é-o de forma muito significativa, uma forma de comunicação.

A ideia de considerar a comunicação como um valor social, nasce, sobretudo com o objectivo de combater a entropia que, para Wiener, era um elemento perverso na compreensão entre os homens. Nesse sentido, a sua argumentação nasce e desenrola-se em torno de um eixo que opõe a informação à entropia, onde o modelo das sociedades “abertas”, que reduzem a desordem entrópica, se opõe ao das sociedades “rígidas”, que a aumentam e, até, numa situação limite, as podem levar a completa desagregação.


Será que vivemos hoje numa sociedade de comunicação?

O homem sempre comunicou através das formas de comunicação que, ao longo da sua existência, constituíram as suas diferentes linguagens nas relações com os outros homens. Nesta perspectiva, as sociedades humanas têm sido sempre sociedades de comunicação. A sociedade de hoje, é uma sociedade que emana informação, onde os mass media e os self media ocupam um lugar de destaque na facilitação do circular dessa mesma informação. Qual é o grande desafio para o homem desta sociedade? É o conseguir gerir toda esta quantidade de informação. Graças às tecnologias de informação e comunicação, toda esta informação encontra-se mais disponível. O problema encontra-se no facto de esta sociedade liberal, utilizar a comunicação para a sua própria sobrevivência política, favorecendo sempre o mecanismo do esquecimento das razões pelas quais se tinha constituído como valor.

Podemos concluir que o projecto utópico de comunicação, no sentido que lhe foi conferido por Norbert Wiener, apresenta-se como um espaço de liberdade e criatividade do ser humano com uma função social positiva, justamente na dimensão que Adalberto Dias de Carvalho projecta para a utopia no seu sentido mais geral, ou seja, a “utopia surgirá, inclusive, em nome da liberdade e da soberania do homem, como um autêntico afrontamento do real. Correria, contudo, o risco de o demolir ao não respeitar de todo as regras e as categorias do conhecimento positivo, o único que lhe permitiria a apreensão correcta dos condicionamentos que influenciam, explicam e, em última instância, projectam o próprio homem”. 1


Informação retirada de:

Manuel João Vaz Freixo, Teorias e Modelos de Comunicação, Lisboa: Instituto Piaget, 2006

Paulo Serra, Comunicação e Utopia, Universidade da Beira Interior

1Adalberto Dias de Carvalho, Utopia e Educação, Porto: Porto Editora, 1994.

Bom Ano 2010!

Desejo a todos os meus colegas, professores, amigos e visitantes do blog um óptimo 2010!